Pode parecer paradoxal esta
semântica, mas não restam dúvidas de que na Europa e em Portugal,
particularmente, não vislumbramos futuro, pois o presente, com todas as
decisões políticas que nos são impostas à bruta e sem contemplações, coarctam a
possibilidade de cada um de nós perspectivarmos um futuro.
Tudo começou com uma crise
financeira, em 2007/2008, mas depressa, por incúria e incompetência (ou não) dos poderes
políticos, a crise financeira transformou-se numa crise económica, pois assim
tinha de ser, dada a necessidade de salvar a Banca. Depois da crise económica
surgiu a crise social, fruto do desemprego, do enorme aumento de impostos, pois
convinha preservar incólume e recuperar os interesses da banca e dos
especuladores financeiros. Hoje o presente é vivido de incertezas, sem futuro,
pois o desemprego, a fome e a miséria de 99% da população já começa a
sobressair, tornando turva a ideia de um futuro que com este presente
certamente não haverá.
O continente europeu, com
especial incidência no século XX, viveu duas grandes guerras mundiais que
destroçaram o continente e destruíram muitos países intervenientes na luta
bélica e fratricida que provocou milhões de mortos. Também na Europa ocorreram
guerras belicistas fruto de intervenções nacionalistas e devido a invasões de outros.
No entanto, não obstante toda a
miséria, fome, destruição e morte causados por estas guerras que manifestamente
mancham de sangue o século onde se assistiu a um dos maiores avanços e
descobertas ao nível da tecnologia - o homem foi à Lua; descobriram-se
tecnologias de apoio à produção que trouxeram mais capacidade de produção e
nível de bem-estar para os povos europeus; fizeram-se descobertas científicas
que muito ajudaram ao nível da medicina a salvar milhões de vidas -, o certo é
que os sobreviventes das guerras, apesar da fome, das privações e provações que
tiveram de viver, tiveram o “privilégio” de lhes ver ser oferecido um FUTURO.
Foi este olhar e acreditar num futuro
que ajudaram à sobrevivência dos meus avós e dos meus pais, como certamente o
de outros milhares de avós e de pais, num presente de privações, de destruição
de fome e de miséria que lhes afectou a vida naquele presente.
O presente que hoje nos oferecem
não é fruto de uma guerra bélica; não se traduz numa destruição física dos
edifícios e das infra-estruturas frutos das bombas disparadas pelos canhões ou
lançadas pelos aviões. Não! Não é este o presente que nos oferecem. O presente
que nos é oferecido pelos responsáveis e decisores políticos, que nos seus
luxuosos gabinetes ou nas salas dos luxuosos hotéis nos traçam e aplicam, é bem
mais letal que as armas bélicas que disparavam, pois sofremos um presente
assoberbado pelos disparos silenciosos das armas financeiras que, com uma
brilhante pontaria, nos atingem a alma, nos levam à dor moral, ao sofrimento
interior, aquele que não se vê fisicamente mas que dói mais que uma ferida
aberta, é o presente vivido com as doenças psicológicas, as depressões que
afectam milhões, pois a incerteza do presente retira toda a projecção do
futuro.
É muito doloroso viver um
presente de desemprego, de medo em perder o emprego, de se deitar à noite e
acordar de manhã sem saber se continua a ter trabalho, de ser alvo de acusações
fúteis por parte do poder político acusando-os de serem responsáveis pela crise
económica, acusados de viver acima das suas possibilidades quando não deve nada
a ninguém, ficou sem emprego por um despedimento colectivo, nunca foi passar
férias fora de casa, nunca fez um crédito.
Esta é uma dolorosa sensação de
viver um presente que não vislumbra um futuro. Um presente onde é incutido o
medo. Um presente onde lhe são surripiados os parcos rendimentos que usufrui,
mesmo do subsídio de desemprego, depois de quase 30 anos a trabalhar. Onde é
retirado parte da reforma. Um presente que obriga quem recebe mais de 200,00€
de reforma a ter de apresentar declaração de IRS. E muito outro medo é imposto
a quem vive.
Os desempregados na Europa são
mais de 25 milhões. Os desempregados em Portugal são perto de um milhão e
quinhentos mil, com um elevado desemprego jovem, e decidem os políticos,
crápulas e cínicos, que a idade da reforma deve aumentar. Decide-se que o
trabalho é um custo e deve ser desvalorizado. Aumenta-se o horário de trabalho
sem ter a devida compensação salarial.
É este presente oferecido aos
portugueses e europeus que transporta nas garras dos especuladores todo um
presente de medo que transforma o futuro numa miragem e obriga a viver o
presente com o pensamento no passado e não no futuro.
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