Em primeiro lugar quero deixar
claro que não sou nem nunca fui deputado nem nunca tive ou tenho qualquer cargo
político remunerado. Nunca recebi o que quer que seja da política. Sou um simples
militante e dirigente concelhio. Em segundo lugar quero dizer que tenho uma
relação de afectividade com António José Seguro e que nunca falei com António
Costa.
Feito este registo de interesses,
importa, então, seguir um trilho de pensamento estribado naquilo que vamos assistindo
no PS ao longo destes penosos quatro meses e olhar sobre o que deveria ser esta
discussão.
Tinha e tenho estima pessoal por
António José Seguro. Mas esta relação de alguma afectividade não poderá/deverá
toldar a minha opinião/visão política sobre o que se está a passar no PS. Por
isso, o que pretendo mesmo é analisar o campo da política.
Se até aqui ia assistindo e
tirando as minhas ilações nesta dolorosa e angustiante campanha interna do PS
sem muita preocupação, hoje, perante as últimas propostas de António José
Seguro – não sei se na qualidade de Deputado, Secretário-Geral ou candidato a
candidato a primeiro-ministro – já sinto alguma preocupação pela deriva
populista que delas se pode extrair. E o pior que poderá acontecer a um partido
político é o seu líder entrar pela via populista e demagógica. É a certidão de
óbito do partido!
Quem ouvir as últimas propostas
de Seguro e se não o conhecer até pensa que estamos perante uma pessoa que
apenas chegou agora à política. Só que António Seguro e António Costa andam na
política e no PS há mais de 35 anos. Como dizia a falecida minha avó, que Deus
a tenha, já fazem parte da mobília!
O coelho tirado da cartola por
parte de Seguro ao anunciar que vai propor pela via legislativa a redução do
número de deputados na Assembleia da República, que deseja restringir a
passagem da política para as empresas/negócios, que quer que os políticos
informem todos os seus rendimentos, que pretende propor a alteração da Lei
eleitoral, etc., são medidas que eu apoio incondicionalmente. Mas há um grande
senão no tempo em que são apresentadas e que a mim me preocupa e não posso
aceitar. É que propostas apresentadas nesta altura não passam de meros actos
eleitoralistas e atingem as raias do populismo.
Seguro iniciou uma purga sobre os
políticos, como se não fizesse parte desta casta há mais de 35 anos. O
candidato Seguro não pode alegar que ele comporta a parte limpa da política e
que a outra parte é o lado negro da política ligada aos negócios, sem
especificar e dizer com clareza onde e como a outra parte é o lado maléfico da
política. Seguro foi líder da JS e deputado europeu, foi e é deputado do parlamento
português, foi ministro e secretário de estado, e é o actual Secretário-geral
do PS, cargo que foi preparando com mestria há muitos anos, mas principalmente
a partir de 2005. Todos nos devemos lembrar que no Altis o cadáver político de
Sócrates ainda estava quente e Seguro anunciava a sua candidatura a Secretário-geral.
Digo e assumo que teve o meu apoio na sua eleição, mesmo eu não tendo
concordado com a fórmula do anúncio, tal qual não concordo com a forma
utilizada por Costa para anunciar que ia desafiar Seguro. Enquanto os governos
Socialistas liderados por Sócrates iam governando, tomando decisões boas e más,
Seguro foi seguindo o seu caminho numa oposição silenciosa. Seguro em seis anos
de governo Socialista apresentou uma proposta de alteração ao funcionamento da
Assembleia da República, que foi aprovada, e nada mais fez na Assembleia, a não
ser aplaudir o discurso de Cavaco Silva que causticou o governo Socialista. Nunca
se quis comprometer com os governos de então. Tal qual o fez após a saída do PS
do governo e a sua ascensão a secretário-geral.
Por razões tacticistas (?) a direcção
do PS permitiu que o governo e a maioria lançassem os maiores anátemas sobre os
governos de José Sócrates. Nunca levantou a voz para defender os governos Socialistas,
quer seja no que de mau fizeram quer no que muito de bom construíram. O PS nos
últimos 3 anos ofereceu um terreno fértil à maioria que nos governa para
destroçar o Partido Socialista. Um Socialista que se preza nunca poderia deixar
passar em claro o gasto discurso de que os Socialistas deixaram o país na
bancarrota e foram eles que salvaram o País, quando este governo transformou a
dívida herdade em 97% do PIB para os actuais 134% do PIB. Um Socialista nunca
poderia deixar passar em claro ou abster-se, mesmo que com violência, um
Orçamento do Estado como o de 2012. Um Socialista nunca poderia aprovar um
tratado orçamental que é o mesmo que colocar um garrote asfixiador a um país a
definhar. Um Socialista não poderia permitir que fosse aprovado um código
laboral maléfico para os trabalhadores – aqui com a conivência da UGT. Um
Socialista nunca poderia aprovar a descida da taxa do IRC para as empresas sem
que ao mesmo tempo os trabalhadores também vissem reduzida a taxa de IRS do seu
trabalho.
Depois de 3 anos de
Secretário-geral do PS porquê só agora Seguro surgir com estas propostas? Teria
o meu apoio para estas propostas de redução do número de deputados, alteração
às leis eleitorais para a Assembleia da República e Autarquias, bem como a
obrigatoriedade do período de nojo após a saída da política, como a
obrigatoriedade da exclusividade dos deputados, com estes a ser obrigados a
divulgar publicamente o seu registo de interesses. Agora, neste momento e neste
período eleitoralista, não o posso fazer.
Vivemos numa sociedade que está a
abominar os políticos e os partidos políticos. Temos uma sociedade que entende
que na política vale tudo e que os políticos são todos uns corruptos. Por isso
é que surgindo uns populistas e demagogos, como o está a fazer Marinho e Pinto,
as pessoas esquecem a ética republicana e em vez de se comportarem como
cidadãos exigentes com os políticos, comportam-se como súbditos dos populistas.
É isto que me parece que Seguro quer explorar. As propostas que Seguro agora
enuncia deveriam ter sido apresentadas logo que tomou posse como Secretário-geral
do PS, e como deputado deveria tê-las levado à Assembleia da República. Não o
fez! Fá-lo agora porque está acossado na liderança e pretende agarrar-se a algo
que o salve. Daí esta perigosa via populista e demagógica. Eu não quero isto
para o PS.
Já relativamente a António Costa,
tenho a dizer que me está a surpreender pela negativa. E essa surpresa advém do
facto de estar a utilizar um tacticismo pernicioso. Ao não pretender responder
aos ataques de carácter que lhe dirigem, Costa está a colocar-se da mesma forma
que o seu opositor: na área da vitimização.
Para ganhar estas eleições
primárias, Costa terá de apresentar propostas concretas. Dizer com clareza o
que quer fazer se chegar ao governo. O que vai fazer junto das instituições
europeias sobre o tratado orçamental.
Estas eleições primárias no PS
são uma novidade no País. É pena que os candidatos não aproveitem a
oportunidade para discutir com seriedade o futuro do País e, principalmente,
iniciar com coragem uma discussão sobre o futuro ideológico do PS.
Mais uma vez temos uma
oportunidade perdida, pois o populismo e a demagogia estão a impedir uma
discussão séria e produtiva sobre o que poderíamos esperar do Partido
Socialista quando chegasse ao governo, fosse quem fosse o vencedor das
primárias.