O
IMI é um imposto sobre o património e tem como fim
a
contribuição para o beneficio, só que essa não é a realidade.
Nas últimas semanas têm sido
dadas à estampa notícias sobre o exponencial aumento do valor do IMI a pagar
pelos proprietários devido ao fim da cláusula de salvaguarda.
Não podemos deixar de levar em
linha de conta que o IMI é um imposto patrimonial e por isso, digamos assim,
lhe é retirado algum protagonismo quando comparado com o IRS, o IRC e o IVA.
No entanto, não será despiciendo
que os contribuintes tenham em atenção o valor do IMI a pagar, pois o mesmo
tornou-se um imposto gravoso para o rendimento das famílias, se atentarmos na
exorbitância dos valores que são cobrados.
Além deste ser um imposto sobre o
património, não deixa de ser verdade que o pagamento exigido pela autoridade
tributária tem de sair do rendimento das famílias, pois o imóvel não dá
rendimento, é apenas a casa de habitação.
E só o facto de se cobrar o
imposto sobre o património, cuja despesa recai sobre o rendimento do trabalho,
que já por si já foi devidamente taxado (IRS e IRC), é, sem dúvida, uma
injustiça.
Contudo, não poderemos olvidar
que os primórdios da tributação já advêm dos tempos de Cristo, pois o Velho
Testamento e o Novo Testamento já falavam no pagamento do dízimo, que nessa
altura incidia sobre o rendimento das terras e propriedades. É que esse dízimo
é tirado ao rendimento não à propriedade, contrariamente ao IMI.
Também convém frisar que nos
finais dos anos 80 início dos anos 90 do século passado o governo de Margaret
Thatcher (a Dama de Ferro), em Inglaterra, foi derrubado devido à introdução de
um imposto sobre o património. É certo que ao longo dos tempos nem sempre foi
consensual a tributação, e esta foi sempre sido adaptada consoante as
necessidade de receita.
Até se chegar ao actual IMI,
criado em 2003, um caminho foi percorrido. No século XIII cobrava-se o imposto
como uma forma de “ajuda” para as necessidades do beneficiário e do poder real.
Desta concepção, passou-se para a ideia de solidariedade social. O imposto
passa a ter um carácter político, ao invés do financeiro.
Em Portugal, até à reforma de
1958, que instituiu a chamada décima, os impostos tinham como objecto de
incidência a divisão em impostos sobre o rendimento da propriedade rústica e
urbana denominada de Contribuição Predial, que com as reformas de 1899 e 1911 a
Contribuição Predial passa a recair sobre o rendimento dos prédios. Isto era, nem
mais nem menos, um imposto sobre o rendimento que os proprietários retiravam
dos seus prédios rústicos e urbanos.
Com a reforma de 1988/89, quando
foi criada a Contribuição Autárquica, há uma alteração substantiva no carácter
deste imposto, que deixa de ser tributado sobre os rendimentos prediais
(Contribuição Predial) e passa a incidir sobre o valor dos prédios (o seu valor
patrimonial).
É a partir desta reforma que os
contribuintes passam a ser tributados, não apenas pelo seu rendimento, também
pelo seu património. É comummente aceite que a Contribuição Autárquica foi
criada para contrabalançar a perda de receitas fiscais no âmbito das autarquias
locais, sendo certo que este imposto reverte para os cofres municipais na sua
totalidade.
Em 2003/2004, é criado o IMI. A
Contribuição Autárquica ambicionava ser um imposto com base no princípio do
benefício. Epíteto concedido também ao IMI, pois os legisladores entendem que
são os Municípios e o Estado a facultar e gerir os serviços urbanos, as redes
de infraestruturas, seja de modo gratuito ou a preços tabelados. Levando em
linha de conta este desiderato oferecido pelo Município e pelo Estado, seria
entendível a existência de um imposto assente no princípio do benefício.
Todavia, hoje parece não ser esta
a realidade, pois uma grande parte das redes urbanas acabou por ser
concessionada a particulares ou a empresas supramunicipais que trabalham com
vista ao lucro. Conforme se constata pela variedade de preços diferentes que se
alcançam. Isto origina que a propriedade imobiliária, dependente dos serviços
prestados por estas redes, acaba por ter de lidar com estes monopólios.
Portanto, é imperioso que se pondere na necessidade de se reflectir sobre as
questões políticas, económicas e jurídicas quando se invocam os benefícios que
é ao sector público que compete assegurar.
Dentro destas redes é imperioso
levar em consideração a construção das redes de infraestruturas em espaço
urbano ou em espaço rústico, tomando em linha de conta que os encargos públicos
com as infraestruturas em meios rústicos se inserem no orçamento como quase que a
fundo perdido; em contrapartida, no espaço urbano esses investimentos podem
consubstanciar um retorno financeiro positivo.
É por isso que entendo que o IMI
é um imposto cobrado injustamente aos proprietários dos prédios urbanos e
rústicos, pois os mesmos não retiram deles qualquer rendimento, servindo apenas
da sua habitação e da família. Para além dos proprietários já serem tributados
pelo seu rendimento, também o são pelo património, de onde não retiram
quaisquer benefícios que não os de estarem a coberto de telha.
A lógica defendida anteriormente,
como a prática do benefício servir de base de sustentação para a cobrança do
imposto sobre o património, cai por terra quando hoje todos sabemos que os
proprietários pagam tudo, desde a ligação da água e do saneamento, como as mais
variadas taxas e licenças de construção. Hoje as entidades políticas centrais e
locais não fazem nada sem obrigarem o contribuinte a pagar. Cai por terra esta
lógica quando a exploração das infraestruturas são entregues a entidades
privadas e intermunicipais que gerem o objecto com base na maximização do
lucro, obrigando o proprietário a pagar um preço fixo tabelado, usufrua ou não
da prestação do serviço. Para além do mais, as entidades gestoras procuram
obter cada vez mais receita da cobrança do IMI e, ao mesmo tempo, vão cortando
benefícios aos proprietários, como comprova a ideia peregrina de desligar a luz
pública. Uma das razões para a cobrança do IMI era a de ajudar a pagar estas
infraestruturas. Mas nada disso acontece, porque as autarquias locais desviam as
receitas deste imposto para outros fins. Aliás como acontece com o Imposto
Único Automóvel.
No Código do IMI há uma série de
entidades proprietárias de imóveis que estão isentas desse pagamento, mesmo
usufruindo de todas as infraestruturas.
Havendo a consciência política
que o fim da cláusula de salvaguarda iria agravar exponencialmente o valor a
pagar pelos proprietários, o governo, de forma eleitoralista, aumentou o valor
dos rendimentos, no Orçamento do Estado para 2015, que davam direito às
famílias a pedirem a isenção do pagamento do IMI, verba essa que se substancia
nos 15 295,00€ de rendimento anual e o valor do imóvel não poderá ultrapassar
os 41 922,00 €. Com esta medida, passaram a usufruir desta isenção cerca de 350
mil famílias, sendo que anteriormente este benefício chegava a 300 mil
famílias.
Só que, contrariamente ao que
pode parecer, com esta medida de aumentar o número de proprietários isentos do
pagamento do IMI, os Municípios não perderão receita em 2015, pois o aumento do
valor a pagar pelos outros ultrapassa de longe o que deixa de receber com o
aumento dos isentos.
Por fim, tendo em atenção que a
isenção é atribuída em função do rendimento e do valor da propriedade, não se
entende como se poderá acudir à ideia de diminuir a taxa de IMI às famílias
numerosas.
O IMI é um imposto que nada tem a
ver com o ter muitos ou poucos dependentes. É tributado conforme o valor do
imóvel em causa. Procurar contornar isto, julgo que juridicamente não tem ponto
de estribo. Até porque uma família com um ou dois dependentes poderá ter mais
dificuldade em pagar do que uma família com quatro ou cinco dependentes, que
até piscina têm e outros confortos.
O que se deveria lutar era por
abolir um imposto injusto como o IMI, pois é um imposto sobre a propriedade e
cujo proprietário, quando é de habitação própria e principal, não retira
quaisquer outros benefícios que não seja o de ter uma habitação. E tendo de
pagar todos os serviços de que usufrui com as infraestruturas, mais razões há para
que este imposto seja abolido.