A confiança é o principal pilar da vivência em sociedade;
a Justiça, a Política e a Banca deveriam ser o exemplo.
Na nossa vivência social somos,
diariamente, confrontados com o vocábulo: CONFIANÇA.
É a confiança nas entidades
públicas e privadas, nas empresas, nos amigos, na família e em todos os
cidadãos que nos faz viver em sociedade. Todos dependemos uns dos outros, e
essa dependência só pode ser completa se houver Confiança.
Uma sociedade só será forte se os
seus membros tiverem confiança nas instituições que gerem as suas vidas e
daquelas de quem dependem, pessoal e profissionalmente. É por isso que, não
obstante toda a tecnologia, é primordial para o bom desempenho de uma sociedade
que haja uma confiança forte entre pessoas e instituições.
Em tudo na vida é necessário
ter-se confiança. Todavia, há três entidades que, na minha opinião, são o
principal pilar da confiança da sociedade: a Justiça, a Política e a Banca.
1 – A Justiça: é consabido que
uma sociedade não pode viver sem o bom funcionamento da Justiça. Por isso, a
Justiça é um Órgão de Soberania, independente e onde os seus actores
desempenham um papel de elevada importância social, pois é deles que depende o
bom funcionamento do Estado de direito.
Só com uma Justiça que dê
confiança às pessoas poderemos considerar que vivemos numa sociedade justa na
defesa dos interesses individuais e colectivos.
Contudo, a Justiça não poderá
oferecer à sociedade percepções de que o seu funcionamento não será o melhor,
ou que o seu desempenho não seja o mais justo e democrático na igualdade de
tratamento, seja quem for os intervenientes.
É por isso que hoje ouvimos da
boca do cidadão comum as invectivas de que a Justiça só funciona para uns e
protege outros. Que a Justiça é lesta a condenar um pobre que rouba um polvo e
um shampoo; mas que é lenta a investigar e a julgar os poderosos. A sociedade
não entende porque se prendem uns para investigação e, por outro lado, deixa-se
em liberdade outros que são indiciados de crimes idênticos. A sociedade não
entende como a Justiça manda arquivar investigações de possível corrupção
quando sobre o mesmo assunto noutros países houve condenações por se provar a
existência de corrupção.
E quando há na sociedade motivos
para que se possa desconfiar do bom funcionamento da Justiça, essa sociedade
começa a ficar doente.
2 – A Política: a Política é a
ciência de governação das Nações. Contudo, os candidatos passaram a utilizar a
campanha como um fim, e não como um meio para alcançar a vitória. Hoje, o
cidadão comum vê-se mais envolvido pela política espectáculo do que pela
vontade dos candidatos em anunciar e explicar as suas intenções e o seu
programa eleitoral. Os políticos não se cansam de fazer promessas; anunciam
tudo o que seja agradável aos ouvidos dos cidadãos; não têm pejo a dizer tudo e
o seu contrário. Prometem sem terem a certeza de cumprir.
A Política deixou de ser uma área
de entrega ao bem comum; um espaço de participação de cidadania; um compromisso
com a sociedade da gestão do bem comum; um pacto social para ultrapassar as
barreiras sociais, as dificuldades económicas; investir na possibilidade da
igualdade de acesso a todos os cidadãos independentemente do seu estrato
social; um acordo com a sociedade de que o bem comum está sempre acima do
interesse individual ou corporativo.
Nos nossos dias os que buscam o
poder na política procuram esse lugar como uma profissão, e não como uma
entrega, uma dádiva, ou uma missão em defesa dos interesses comuns.
Tem sido apanágio dos líderes
políticos e candidatos prometerem tudo quando estão na oposição com o único
fito de chegar ao poder. Lá chegados fazem tudo ao contrário do que prometeram.
Juraram não cortar salários, o que fizeram quando chegaram ao poder foi cortar
salários e o subsídio de Natal; prometeram não aumentar impostos, a primeira
medida que tomaram foi aumentar os impostos; gritavam que tinham a solução
mágica para a resolução dos problemas financeiros do país que apenas bastava
cortar nas gorduras do Estado, chegados ao poder não encontraram gorduras no
Estado.
Hoje, a política não tem
credibilidade aos olhos do cidadão comum porque os políticos perderam a
vergonha, não têm carácter nem honra, e mentem com facilidade. O memorando da
troika era o seu programa de governo e iria para além da troika, confrontado
com isso diz que o memorando da troika tinha as contas erradas e não tinha sido
ele a fazê-las. Mandou os professores emigrar para Angola, confrontado com
essas afirmações afirmou que nunca mandou ninguém emigrar e que isso era um
mito urbano. Pede a reeleição em Outubro próximo, mas esconde dos portugueses
as medidas com que se comprometeu com a União Europeia de cortar 600 milhões de
euros nas reformas e pensões.
Quando os políticos enveredam
pela arte da mentira, estiolam a confiança que os cidadãos tinham na política e
nos políticos. Um país onde os cidadãos não têm confiança na política é uma
sociedade em desagregação, onde as mais básicas normas de carácter estão
feridas de morte.
Quando se perde a confiança na
política, a sociedade está doente e deixa de intervir no sentido de procurar,
com as ferramentas que a Democracia lhe concede, construir um País melhor e uma
sociedade mais justa e igualitária.
3 – A Banca: para além da Justiça
e da Política, a Banca é um dos pilares de sustentação do bom funcionamento de
uma sociedade.
É através da Banca que os
cidadãos podem aplicar o seu dinheiro; podem pedir empréstimos para as suas
necessidades; é onde as empresas recorrem para se financiar e poderem exercer a
sua actividade.
Sendo a Banca uma entidade de
extrema importância no funcionamento da sociedade em todos os seus sentidos, a
mesma terá de ter um exemplar grau de fidúcia perante a sociedade.
Contudo, hoje, os cidadãos não
têm confiança na Banca. A sociedade olha para os desmandos provocados pela
Banca e não confia nas entidades bancárias. Os exemplos do BPN, do BPP, do
Millennium bcp e, essencialmente, a decisão do governo com o BES, levam a
sociedade a não confiar nessas entidades.
O que se está a passar com os
lesados do BES é o exemplo acabado de que a sociedade perdeu a confiança nos
bancos, no governo e nos reguladores.
O mundo financeiro requer um
conhecimento profundo da sua linguagem. E todos sabemos que a maioria dos
cidadãos não domina essa linguagem. E por esse motivo os clientes depositam a
sua confiança no banco e nos trabalhadores das entidades bancárias que escolhem
para poderem aplicar as suas poupanças ou recorrer ao crédito bancário.
Portanto, quando a sociedade convive
com a Banca, está a lidar de boa-fé e tem confiança nessa entidade. Quando as
coisas começam a correr mal, a sociedade deixa de confiar e os problemas
começam a surgir.
O mais caricato de tudo é o
exemplo dos lesados do BES. Estes clientes do BES confiaram no banco, confiaram
nos funcionários e depois assistiram a uma decisão do governo, dando a cara por
isso o governador do Banco de Portugal, de encerrar o BES e criar uma nova
entidade bancária que não assumiu os investimentos no papel comercial que os
clientes fizeram no grupo BES/GES.
Ora, pergunta-se o que andaram a
fazer os reguladores – Banco de Portugal e CMVM – , será que nunca souberam da
forma como o BES estava a vender o papel comercial do grupo? Acho impossível!
Como entidade reguladora, por que motivo não intervieram quando o grupo BES/GES
começou a vender aos balcões do BES o papel comercial do grupo?
Os lesados do BES, como todos os
cidadãos, perderam toda a confiança na Banca e nos reguladores, para além de
todo o papel desempenhado pelo governo, que no caso do BES foi a mão por detrás
do arbusto.
Só a título de exemplo, os
contribuintes portugueses suportaram perto de 10 mil milhões de euros para
salvar a banca portuguesa, e os contribuintes europeus pagaram mais de 590 mil
milhões de euros para tapar os buracos dos bancos.
A perda de confiança da sociedade
na Justiça, na Política e na Banca é sinal de uma sociedade doente e
desmantelada.
*Crónica publicada no Jornal Notícias de Esposende, n.º 31/2015 – 27 Agosto
a 2 de Setembro.