Ser Bombeiro é servir os outros, é ser altruísta, é ser confidente, é ser destemido
Recentemente a Associação
Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Esposende comemorou 125 anos. Também a
Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Fão comemorou 90 anos. São
muitos os anos de serviço ao socorro das populações.
Mas são muitos dias, muitas horas,
que ao longo do tempo o Bombeiro deu de si para salvar vidas e bens materiais;
são muitas noites sem dormir; muitas lágrimas conseguiram evitar, mas não
conseguiram impedir derramar outras tantas; seja no Verão ou no Inverno, vidas
socorridas foram muitas, a todo o tempo o Bombeiro responde ao pedido de
socorro na doença, no acidente na estrada ou no trabalho, no incêndio florestal
ou urbano, no afogamento ou no naufrágio, na intempérie, nas operações de busca
e nas acções humanitárias.
Ao som lancinante da sirene, que
serve de caixa-de-ressonância e ampliação da voz embargada e desesperada de
quem pediu socorro aos bombeiros, o bombeiro abandona a sua cama, deixa o comer
em cima da mesa, larga o lugar do sofá onde desfrutava do merecido descanso,
deixa a meio a ajuda aos filhos nos trabalhos escolares, esquece a sua família
e o seu descanso e parte. Fecha a porta da sua casa e vai em direcção ao quartel.
Não pensa que poderá ser a última vez que faz o gesto de fechar a sua porta.
Não perde tempo em pensar se voltará para abrir a porta da sua casa e encontrar
a sua cama, a comida na mesa, o lugar no sofá, os filhos para ajudar a terminar
os trabalhos escolares e a mulher à sua espera.
No seu espírito altruísta e de
voluntariado o Bombeiro apenas quer chegar ao quartel o mais depressa possível
e tomar o seu lugar na ambulância ou no carro de incêndio. É isso que o move!
No meio da intempérie é o
Bombeiro o primeiro a socorrer quem vê as suas casas inundadas e os seus bens
danificados. É o Bombeiro o primeiro elemento da protecção civil a chegar junto
das populações, enquanto outros continuam no seu sono retemperador no quente
das suas casas… sob a chuva ou sob o sol, o Bombeiro, muitas vezes sem descanso
e sem comer, luta, cara a cara, de agulheta na mão, ali mesmo junto à língua de
fogo, resistindo ao calor infernal e esquecendo que dali pode não sair vivo,
apenas com a intenção de proteger as pessoas e os bens - e quantas são aquelas
que nada fazem para proteger o que é seu atempadamente?...-, face a face com a morte o Bombeiro procura
escorar a derrocada, vai ao encontro do náufrago, do afogado, encontra-se com o
perigo, imagem da vida e face da morte, o Bombeiro nunca nega a mão amiga junto
dos aflitos, dos agoniados, são o bálsamo para a dor do corpo e da alma
daqueles que sentem perder a vida e perder tudo o que têm: a raiz mais funda da
entrega ao outro, da doação até ao fim, é a audácia, é este o sacrifício de
homens e mulheres que se dedicam ao voluntariado, à dádiva, e é neles que se
encontra o verdadeiro heroísmo, que se dão num tempo tão perene, num tempo tão
fácil em criar e proclamar heróis balofos aclamados por turbas ululantes, mas
que não valem nada comparados com o anonimato do Bombeiro, que com o ardor do
silêncio, a discreta abnegação à causa, sem queixas e sem alaridos, mesmo
sacrificando a sua vida e a sua família, o Bombeiro é presente, é entrega, é
causa, é dor, é alma, é confidente, é o rosto que o desesperado primeiro vê, é
o Bombeiro que socorre o desconhecido, não importa que seja branco ou preto,
não tem em conta o seu credo, não quer saber se é rico ou pobre: apenas um ser
humano!
Sem queixume, sem alarido, com
uma discrição do tamanho do mundo, o Bombeiro é a excelência do mérito e do
esplendor. O seu exemplo é a escola de valores bebido dos antecessores. É esse
o espírito do Bombeiro!
O Bombeiro compreende as
incompreensões, as críticas, mesmo que injustas, é apenas o seu espírito
humanista e humanitário, a sua dádiva à causa do voluntariado, à entrega na
ajuda ao outro, o servir no campo onde a seara cresce fruto da sementeira do
altruísmo e do amparo, seara que honra um vasto percurso colectivo, um tributo
ao altruísmo que cresce desde a fundação, desde o desenho gizado por uma gesta colectiva
de humanismo num filão inesgotável e inestancável do magnânimo princípio de
entrega à protecção de vidas e de bens.
Aqui fica o meu tributo a todos
os Bombeiros, especialmente e particularmente aos Bombeiros das corporações de
Esposende e Fão, que nesta fase aniversariante se podem orgulhar da escola de
valores que formam nos seus voluntários.
Como nado e criado no concelho
estou grato a todas as gerações de Bombeiros que foram engrandecendo as
corporações. Mas também envio a minha gratidão a todos, desde o comando às
direcções, que desde a génese das duas corporações muito têm feito para
engrandecer estas tão nobres Associações. Não esqueço neste abraço de gratidão os
associados e benfeitores, que graças a eles também as Associações existem.
Obrigado aos Bombeiros por tudo o
que fazem! Peço que continuem a prosseguir o belo ideal que abraçam. Acudi aos
desastres, às doenças súbitas, aos incêndios. Mostrai coragem no combate às
chamas ardentes, mas não deixeis que esmoreça a chama, o incêndio, que palpita,
crepita, dentro de vós. Não deixeis sucumbir na alma a chama incandescente que
vos fornece a energia para continuardes ao serviço da causa humanitária que
materializa a força que há em vós num espírito altruísta que sustenta a nossa
sensação de segurança.
A vossa energia advém do pão da
entrega que vos alimenta e que muitas vezes é o último reduto, o último assomo
de esperança de quem se encontra em risco e no limite da sua vida.
Agradeço todas as horas que
roubais à família para dar aos outros! Reconheço em vós uma família, a família
dos bombeiros que abraçados aos machados nos demonstram o seu amor à causa, o
seu companheirismo, os seus laços com as populações, a vossa devoção e orgulho
de capacete dourado resplandecente de luz que brilha nos sóis da nossa terra.
Obrigado pelo vosso suor despendido na ajuda, no socorro, na luta inglória
contra as chamas e contra as águas revoltantes que tudo arrastam. Obrigado pelo
vosso espírito de missão, pela vossa coragem de vos levantardes quando o
cansaço aperta e quando o desânimo se aproxima. Obrigado por muitas vezes
serdes o sorriso e o abraço, o seguirdes em frente mesmo quando fostes em
grande velocidade mas não chegastes a tempo. Obrigado por não desistirem às
críticas injustas e incoerentes, pois apesar da velocidade ultrapassada não
pudestes chegar a tempo, pois vós compreendeis, no vosso espírito humanista,
que essas criticas saíram de bocas angustiadas, desesperadas, pois tudo
perderam.
Obrigado Amigas e Amigos!
Continuai em frente ao serviço de todos nós. Neste tempo de aniversário aqui
fica a minha humilde e singela homenagem pública aos Bombeiros de Esposende e
Fão, em particular, e aos Bombeiros de Portugal e do mundo.
Nota: o autor escreve segundo o
antigo AO.
*Crónica publicada no jornal
Notícias de Esposende, n.º 04/2016 de 23 de Janeiro.