quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

PELA NOSSA SAÚDE, LUTEMOS*

A saúde é um bem que deveria ser de todos,
e acessível a todos!

N
as últimas semanas têm vindo a pública notícias e acontecimentos que trazem à colação a precariedade dos cuidados de Saúde em Portugal, nomeadamente no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O SNS foi uma das maiores conquistas trazidas pela Revolução de Abril de 1974! Com este Serviço, a população portuguesa, desde as grandes cidades às aldeias mais remotas deste Portugal com vista para o Atlântico, viu melhorar a sua qualidade de vida, pois o acesso aos cuidados mais básicos de Saúde era garantido por um serviço público de proximidade. Sendo exemplar a extraordinária redução da taxa de mortalidade infantil. Portugal, graças ao SNS, deixou de ser um dos países da Europa com a maior taxa de mortalidade infantil para se tornar no país da Europa com a mais baixa taxa de mortalidade infantil. E isto é impagável!
Não queremos ser líricos e pensar que no SNS tudo eram maravilhas. Nada disso!
Todavia, o facto de haver necessidade de algumas alterações de pormenor, mormente na componente do controlo da despesa em casos específicos e não na generalidade, não era motivo para que o governo actual promovesse o maior ataque ao SNS, tudo fazendo para desmantelar esta preciosa prestação de serviços médicos público à população. Desde a imposição de orçamentos rígidos que impediram os hospitais de funcionar com normalidade; à gestão do pessoal médico, de enfermagem e auxiliar, entregando a sua contratação a empresas de trabalho temporário e impedindo as administrações hospitalares de contratar pessoal e cortar na compra de medicamentos necessários e imprescindíveis para o tratamento e a cura dos doentes; terminando com a desqualificação dos hospitais, provocando a perda de valências em muitos, que deu origem a que as populações tivessem de ir para localidades mais distantes para consultas externas de especialidade, para serviços de urgência e para outros cuidados de saúde, tudo serviu para denegrir o SNS.
Sob a capa do argumento do memorando da troika, o governo de Passos Coelho e do contabilista Paulo Macedo, procedeu a cortes drásticos no Orçamento da Saúde. Com o estrangulamento financeiro aos hospitais e tornando mais caro o acesso à saúde à população, este governo iniciou a purga necessária para desmantelar o SNS. E estão a consegui-lo! Os governantes mentiram aos portugueses, pois sempre argumentaram que estavam a cumprir o acordado com a troika. Mas a mentira tem “perna curta”, e Passos Coelho e Paulo Macedo foram desmentidos por um relatório da OCDE que diz que «Portugal cortou na Saúde o dobro do que tinha negociado com a troika». Como se pode verificar, não foi a troika nem o memorando herdado que obrigou o governo a tomar as medidas contra o SNS. Foi, isso sim, uma intenção ideológica deste governo em desmantelar o SNS.
No entanto, estamos perante um governo em completo desnorte, sem rumo, e que a proximidade das eleições lhes tolhe o raciocínio e seca os pucos nerónios que lhes resta.
Não bastava todo o caos nos serviços de urgência, onde as pessoas tiveram que esperar, em alguns casos, 23 horas para serem atendidas no Serviço de Urgência. O caos estava montado! Ninguém assumia responsabilidades, todos empurram de um lado para o outro. Os directores de Serviços em alguns hospitais demitiram-se em bloco, alegando falta de condições de trabalho.
Perante este caos estabelecido, morreram 8 pessoas nas urgências hospitalares à espera de serem atendidos pelos médicos. Os internamentos tornaram-se um caos. A falta de pessoal médico e de enfermagem dá origem a que os cuidados médicos prestados aos doentes possam não ser os melhores. Perante este cenário, tenho quase a certeza que há muita gente a morrer antes do tempo.
Depois do caos nas urgências, eis que um novo caso surge na comunicação social e que demonstra a insensibilidade humana que este governo tem. Falo do caso dos doentes com Hepatite C! É inconcebível que uma pessoa morra por falta de um medicamento que o governo não que comprar por o achar caro.
Os doentes com Hepatite C estão à espera que o governo decida comprar um medicamento que em 90% dos casos lhes traz a cura. Mas o governo não está preocupado com a cura e salvar da morte estes doentes. A preocupação do governo é financeira. O governo entende, pela voz do Ministro da Saúde e do Primeiro-ministro, que o medicamento é muito caro e que a empresa farmacêutica tem de reduzir o preço. Falamos de um medicamento novo que custa cerca de 41 mil euros. Será que a vida de uma pessoa não vale mais de 41 mil euros? Se fosse Paulo Macedo ou Passos Coelho, ou alguém da sua “entourage” familiar e política eles perdiam tempo a ratear o preço como se estivessem numa feira? Certamente que não!
Uma mulher de 51 anos, que sofria de Hepatite C, acabou por morrer sem que o governo decidisse comprar o medicamento que a salvava da morte. Esta doente passou o último ano em constantes tratamentos e internamentos. Quanto custou esta senhora ao SNS no último ano com os tratamentos e os internamentos? Talvez mais que os 41 mil euros que custa o medicamento que a poderia salvar. Mas o governo preferiu andar na feira a regatear o preço e a fazer um “braço-de-ferro” com a empresa farmacêutica que produziu e comercializa o medicamento.
Muitos doentes esperam que o governo lhes disponibilize esse medicamento que os pode salvar. Um dos doentes, por carta dirigida ao ministro Paulo Macedo, já se disponibilizou a pagar metade do valor do medicamento. Do ministro nem resposta obteve! Esta semana, o mesmo doente, na audiência parlamentar ao Ministro da Saúde na Assembleia da República, suplicou a Paulo Macedo que não o «deixe morrer». Perante este pedido lancinante de quem vê que se pode curar mas por um capricho do governo do seu país corre o risco de morrer antes do tempo, o que fez um deputado do PSD que estava nessa audiência, Miguel Santos, interveio, e em vez de demonstrar solidariedade pelos doentes, vociferou contra os mesmos, apelidando de “circo” o que ali estava a acontecer. Esta é a exemplar forma como o governo e a maioria trata os portugueses.
Como todos nos lembramos, Passos Coelho não se cansou de afirmar que iria cumprir escrupulosamente o programa da troika, que apelidou do seu programa de governo e que iria para além da troika, “custe o que custar”, vindo agora, confrontado com o problema dos doentes com Hepatite C que «deve-se fazer tudo para salvar vidas, mas não custe o que custar». E acrescentou «Pagar uma fortuna para aceder ao medicamento não nos parece uma coisa equilibrada».
Este governo parece seguir a lógica de deixar morrer os doentes graves e os idosos para poupar nas reformas? Passos Coelho tem a desfaçatez de nos dizer que temos de empobrecer “custe o que custar”, pois custe o que custar temos de pagar a dívida e os juros. Este governo que se quer fazer duro a negociar a descida do preço do medicamento que pode salvar a vida dos doentes, é o mesmo que não tem a coragem de negociar a descida do valor dos juros da dívida que estamos a pagar!
Só de juros da dívida pagamos por ano tanto como o que gastamos com o Serviço Nacional de Saúde – oito mil milhões de euros. Temos um governo forte com os fracos e fraco com os fortes! Só nos resta esperar pelas eleições e correr com eles, mas até lá ainda vão fazer o mal e a caramunha.
Resta, por fim, acrescentar que em Portugal os tumores matam 70 pessoas por dia, e 10 000 novos doentes por ano são recebidos no IPO do Porto.
É urgente que as políticas para a saúde comecem a orientar-se para a prevenção, pois só assim haverá menos mortes e menos despesa no tratamento.

*Artigo publicado no Jornal Notícias de Esposende, n.º 5/2015 – 7 a 13 de Fevereiro.